sexta-feira, 9 de novembro de 2007

Educação e cultura no mesmo caminho

Rosângela e Lúcia, do bairro de Felipe Camarão



Sentada uma ao lado da outra, Lúcia e Rosângela vieram ao TEIA para falar sobre os projetos do Ponto de Cultura Conexão Felipe Camarão, do bairro de Felipe Camarão, na zona oeste de Natal, capital do Rio Grande do Norte.

Embora o assunto seja o mesmo para as duas, Lúcia e Rosângela desempenham papéis diferentes na história da Conexão. Lúcia é uma das coordenadoras da ONG e Rosângela é diretora da Escola Municipal Clara Camarão. Mas seus caminhos foram cruzados porque, além de ONG e escola ficarem a quatro quarteirões de distância uma da outra e as crianças serem comuns aos dois espaços, os objetivos de ambas eram e são muito parecidos: oferecer caminhos diversos aos pequenos moradores do bairro. Caminhos que poderão ser trilhados a partir da cultura, da arte e da educação, uma junto com a outra.

"A Conexão Felipe Camarão é um projeto patrocinado pela Petrobrás e pela Lei de Incentivo do Ministério da Cultura e atua na comunidade com ações culturais socioeducativas para crianças, adolescentes e jovens de 4 a 24 anos", explica Lúcia.

Na ONG ocorrem oficinas como a de rabeca, instrumento confeccionado pelos próprios meninos e meninas, que aprendem a tocá-los depois nas aulas de música. Das oficinas, inclusive, foi montada uma orquesta de rabeca que se apresentará amanhã, dia 10, com Jards Macalé. Há também a oficina de flauta pífano; o teatro de bonecos mamulengos João Redondo; a de boi de reis; a de percussão como o coco de zambe, caboclinhos, batuque de índio; e a de capoeira.

Além das oficinas, a ONG participa da Associação Griô Nacional, de um projeto do MEC para realizar ações educativas complementares e é um Ponto de Cultura, onde crianças e jovens aprendem a linguagem audiovisual e produzem vídeos sobre a comunidade.

"Todas as nossas atividades são fundamentadas na cultura de tradição oral e musicalidade oral", conta Lúcia. No bairro de Felipe Camarão, três mestres deixaram seus ensinamentos para as próximas gerações e são eles que são difundidos pela ONG.

O Mestre Manoel Marinheiro era a figura principal das manifestações culturais de Boi de Reis e hoje, já falecido, deixou para a esposa e a filha o legado de serem Griôs. Já o Mestre Chico de Daniel, também já falecido, era o mamulengueiro do bairro e deixou seus bonecos para o filho Josival, que hoje é o oficineiro da Conexão Felipe Camarão. O Mestre Cícero da Rabeca é o único vivo, com 86 anos.

Educação e cultura de mãos dadas

A parceria com a escola Clara Camarão começou em 2004, já na gestão de Rosângela. Nessa época, a escola era aberta nos fins-de-semana para os alunos que não tinham outros espaços de lazer na comunidade. Era o período em que a Conexão aproveitava para fazer suas oficinas dentro da escola.

"Eu abri a escola para a ONG e a comunidade porque achava importante que essas crianças estivessem inseridas em alguma atividade", lembra Rosângela. A parceria deu certo e gera resultados: "Essa criança que participa tanto da escola, quanto da conexão tem uma formação diferenciada de outra que não participa. Com as nossas rodas de conversa e as nossas atividades eles tem o entendimento do que é ser cidadão. Até para questionar se esse é o modelo de ONG ou escola que ele quer", garante Lúcia.

No começo do ano, a Conexão e a Clara Camarão começaram a trabalhar os conteúdos escolares juntas. "Se o menino ou a menina vai aprender a ler e a escrever, porque não pode ser com uma música que faz parte da realidade dele?", questiona Lúcia. Rosângela concorda, mas ainda enfrenta resistência de alguns professores. "Eles ficam ressabiados no começo. Hoje já temos 13 professores trabalhando esses conteúdos."

Essa aproximação do conteúdo escolar com a vivência diária no bairro é importante também para o resgate da cultura e a valorização de Felipe Camarão. "Se as crianças não conhecem o valor simbólico e cultural de sua comunidade, como valorizará aquele ambiente?", pensa Lúcia. "Estamos levantando a arte e a cultura de Felipe Camarão por meio das crianças, dos adolescentes e dos jovens."

Hoje, 400 meninos e meninas do bairro freqüentam as atividades diariamente.

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